Kiwi: el nuevo feminismo sube a escena

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Em Carne, a revivescência do feminismo em nível mundial encontra o teatro agit-prop – criado pelas vanguardas russas no bojo do comunismo soviético dos anos 1920 e logo espalhada à Europa, em especial à Alemanha, e aos Estados Unidos – com propósitos de conscientização e mobilização políticas de urgência.

A Kiwi, companhia paulista com vinte anos de trajetória, concebeu Carne em 2009 e mesmo após duzentas récitas não consegue mais deixar de apresentar o espetáculo, sob demandas diretas de movimentos sociais e de setores sindicais reivindicantes de ampliação de representatividade social das mulheres.

Com linguagem de teatro-documentário, porém isenta de didatismos e a ecoar urgências, as atrizes Fernanda Azevedo e Mônica Rodrigues (esta em revezamento com Maria Carolina Dressler) esmiúçam com olhar crítico aguçado ao ponto máximo estatísticas sobre crimes hediondos (e impunes) no País, passagens bíblicas sobre o papel tradicionalmente secundário ou serviçal das mulheres, saídas do Eclesiastes e das Cartas de São Paulo aos Coríntios, publicidades chauvinistas até o limite do nojo e, a par disso, reproduções de trabalhos artísticos contemporâneos engajados por abolição de estereótipos de submissão.

Também recontextualizam, graças à “lupa” do palco e de suas luzes, o sentido de bonecas infantis de todos os tempos, ainda largamento vendidas, bem como de utensílios domésticos e acessórios de beleza destinados a perpetuar conceitos de “fragilidade” e “disponibilidade” femininas.

Nem mesmo a MPB escapa do crivo desse roteiro, de autoria de Azevedo com o diretor Fernando Kinas, como nas citações, dentre várias outras, das letras dos clássicos Ai, Que Saudades da Amélia (Ataulfo Alves e Mário Lato) e Mulher Indigesta (Noel Rosa). A eficácia do discurso da Kiwi é tal que, depois de assistir ao espetáculo, será impossível ligar uma TV sem chocar-se continuamente com a naturalidade com que são passadas mensagens de rebaixamento feminino.

al eficácia de comunicação ampara-se, de maneira tripla, entre diálogos, projeções de imagens (a remeter ao teatro do alemão Erwin Piscator dos anos 1930 a 1950) e música ao vivo.

Em ritmo vertiginoso, porém sempre inteligível, os textos jamais redundam em obviedade e denotam retrabalho constante ao longo da longa trajetória da montagem, a partir das próprias respostas das plateias, em debates realizados após a encenação.

Ao longo de quase todos os noventa minutos, as intérpretes dialogam com percussão ao vivo e com músicas disparadas em caixas de som por DJs. Por fim, há a provocação constante à plateia, de maneira respeitosa, mas incisiva.

A nova temporada, em três teatros municipais, deve repetir o sucesso de acabamento técnico e a repercussão de temporada recentemente promovida pelo Sesc-SP (Belenzinho), quando Carne integrou a ocupação Arte – Substantivo Feminino, com quatro meses de espetáculos de teatro e dança, além de oficinas e debates sobre o tema.

Carne: apresentações com ingressos grátis em São Paulo de sextas a domingos.

Teatro Cacilda Becker (Lapa), de 13 a 15 de maio.

Teatro Martins Penna (Penha), dias 21 e 22 de maio.

Teatro Alfredo Mesquita (Santana), de 27 a 29 de maio.

Publicado en Carta Capital
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