20° Festival de Río

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Festival do Rio chega à 20ª edição mais enxuto, com 200 filmes de 60 países; veja programação

Por Carlos Brito

Foi mais tarde que o normal, foi sofrido, e, por muito pouco, quase deixou acontecer. Mas, apesar da série de dificuldades que levaram ao seu adiamento e a uma possível não realização, a 20ª edição do Festival do Rio enfim tem início nesta quinta-feira (1), com a exibição de «Viúvas», de Steve McQueen, no Odeon, Cinelândia.

Ao todo, serão 200 títulos – 50 a menos que em 2017 e 150 a menos que em 2014 – de 60 países exibidos em 20 locais da cidade desta quinta até o próximo dia 11, quando o festival será encerrado com a exibição de «O Grande Circo místico», de Cacá Diegues, representante do Brasil na corrida pelo Oscar em 2019 (veja a programação completa no site do Festival do Rio).

A falta de patrocinadores provocou o adiamento do festival, a princípio previsto para ser realizado entre os dias 4 e 14 de outubro. Não por acaso, o evento terá 50 filmes a menos que a edição do ano passado. Ainda assim, o cardápio de opções cinematográficas é bastante variado.

Serão exibidos novos trabalhos de diretores consagrados e premiados nos maiores festivais do mundo, como Lars Von Trier («A casa que Jack construiu»), Gus Van Sant («A pé, ele não vai longe»), Jean-Luc Godard («Imagem e palavra»), Mike Leigh («Peterloo»), Spike Lee («Infiltrado na Klan»), Jafar Panahi («3 Faces»), Julian Schnabel («No portal da eternidade»), Nadine Labaki («Cafarnaum»), Olivier Assayas («Vidas Duplas») e Pablo Trapero («A quietude»).

O festival ainda traz outros destaques: uma nova versão de «Imagine», de John Lennon e Yoko Ono; «Não me toque», de Adina Pintilie, filme que levou o Urso de Ouro na edição mais recente do Festival de Berlim; «Assunto de família», de Hirokazu Kore-Eda, grande vencedor Palma de Ouro em Cannes este ano, além de «Em chamas», de Lee Chang-dong, filme baseado no conto «Queimar celeiros», do escritor japonês Haruki Murakami e vencedor do prêmio da crítica no Festival de Cannes 2018.

'Assunto de família', de Hirokazu Kore-eda, vencedor da Palma de Ouro, em Cannes, está na programação do festival. — Foto: Divulgação

‘Assunto de família’, de Hirokazu Kore-eda, vencedor da Palma de Ouro, em Cannes, está na programação do festival. — Foto: Divulgação

O conjunto de filmes que compõem o festival está dividido em seis mostras: Panorama, Expectativa 2018, Première Latina, Première Brasil, Midnight e Film Doc.

As sessões de gala da Première Brasil serão realizadas no Estação Net Gávea, Estação Net Botafogo e no Cine Odeon.

As já tradicionais sessões populares seguidas de conversas do público com realizadores e atores e atrizes dos filmes terão lugar no Centro Cultural Cine Odeon e no Estação NET Rio.

Bruna Linzmeyer em 'O Grande Circo Místico', de Cacá Diegues - filme vai encerrar o festival. — Foto: Divulgação

Bruna Linzmeyer em ‘O Grande Circo Místico’, de Cacá Diegues – filme vai encerrar o festival. — Foto: Divulgação

 

Ao todo, 84 obras brasileiras – entre produções totalmente nacionais e coproduções – poderão ser vistas no evento. Além disso, quatro longas clássicos do cinema nacional serão exibidos em versões restauradas: «Rio 40 graus» (1955) e «Rio Zona Norte» (1957), ambos de Nelson Pereira dos Santos – morto em abril deste ano –, «Pixote: a lei do mais fraco» (1981), de Hector Babenco, e «Central do Brasil» (1998), de Walter Salles.

O Festival do Rio também trará uma série de convidados especiais do exterior – entre eles, o diretor francês Olivier Assayas, responsável por obras como «Acima das nuvens» e «Personal shopper».

Festival do Rio 2018

  • Datas: de 1º a 11 de novembro
  • Programação no site do evento ou na revista digital
  • Em cartaz em 21 salas de cinema

G1


‘Nós não nos suicidamos, somos suicidados’, diz cineasta trans Ariel Nobre no Festival do Rio

Na noite em que a violência urbana entrou em pauta no 20º Festival do Rio, chamou atenção o forte discurso de sobrevivência feito pelo diretor de um curta-metragem exibido entre os longas «Relatos do front» e «Nóis por «nóis», ambos projetados em competição na mostra Première Brasil.

Ao apresentar a sua obra «Preciso dizer que te amo», o cineasta Ariel Nobre pediu mais presença de pessoas trans, como ele, em posições de destaque na indústria do audiovisual. E declarou que a sessão deste domingo representava uma segunda transição em sua vida: de personagem trans para documentarista.

— Chega de filmes sobre nós. Agora precisamos ocupar espaços para produzir e decidir as narrativas. Só assim vamos parar com a matança. Nós não nos suicidamos; somos suicidados. Mais do que objetos de arte, somos artistas. Mais do que tema de campanhas publicitárias, somos publicitários — discursou Nobre, sob muitos aplausos e após pedir que todos os homens trans da plateia se levantassem.

Ele aproveitou para defender editais afirmativos para LGBTs.

«Preciso dizer que te amo» é um documentário autobiográfico sobre a luta contra o suicídio de pessoas trans. Começa com uma narração descrevendo o momento em que um personagem decide tirar a própria vida.

No mundo real, Nobre flertou com o suicídio em 2015 após sofrer um ataque homofóbico. Decidiu, porém, dizer a algumas pessoas que as amava. Assim, surgiu o projeto «Preciso dizer que te amo», no qual escrevia a frase em paredes, corpos e objetos. A iniciativa virou ensaio fotográfico e, agora,

O cineasta Aly Muritiba disse que era uma honra exibir o seu filme «Nóis por nóis» na mesma sessão que Nobre.

Adaptação da série de TV homônima exibida ano passado na TV Brasil, o longa de Muritiba e Jandir Santin explora a violência na periferia de Curitiba a partir de três jovens que se veem na chance de denunciar o abuso policial na região depois que um amigo deles morre sob condições misteriosas durante um baile.

Num primeiro momento, Mari, Gui e Japa desconfiam que o assassinato pode ter sido cometido por um traficante que mantém o monopólio de vendas na comunidade. No entanto, um celular deixado pela vítima revela o possível envolvimento de PMs. O trio vai atrás de outras evidências enquanto reflete sobre o risco de levar a público as provas colhidas.

— É triste, mas especial, exibir esse filme exatamente uma semana após a eleição, porque é uma obra de resistência, construída por um coletivo enorme de gente do movimento negro — disse Aly Murtiba, cujo «Ferrugem» venceu este ano o troféu Kikito de melhor filme no Festival de Gramado.

Mais cedo, foi exibido o documentário «Relatos do front», de Renato Martins, que busca explicar as razões por trás das milhares de mortes anuais em confrontos no Rio de Janeiro. A partir de entrevistas com policiais, mães de jovens assassinados, sociólogos, jornalistas e ativistas, o filme constrói a tese de que a violência urbana remonta à escravidão, quando teria surgido a noção de «nós contra eles». E conclui: todos —tanto a polícia quanto as favelas — perdem com as falhas de segurança pública. A sessão contou com a presença de vários entrevistados no documentário.

— Meu encontro com o Renato Martins demonstra o rompimento da barreira que existe entre polícia e sociedade — afirmou Sérgio Barata, policial há 29 anos. — Não podemos simplesmente ver o Estado como inimigo. Somos todos vítimas.

— Esse é um filme que ouve todos os lados do conflito urbano para propor um debate. Não aponto dedos — explicou o diretor Renato Martins. — As políticas já não funcionam há 30 anos. A pergunta é: queremos mais três décadas de morte, dor e perda?

O Festival do Rio vai até dia 11 de novembro.

 

Globo

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