Manual de resistencias
Jorge Mautner faz manual de resistência e homenageia Marielle
A primeira canção é como um ofertório familiar, crepuscular, de um homem que já inventaria o seu legado (que nada tem de físico, só de afetividades): a filha Amora, a neta Júlia, o candomblé, a fé, o equilíbrio da ioga, o zen, a pacificação pelo reggae, o ritmo, o destemor. O nome da música, Ruth Rainha Cigana, é uma reverência à historiadora Ruth Mendes, que foi companheira de Jorge Mautner.
Com Não Há Abismo em Que O Brasil Caiba (título extraído de uma frase do filósofo português Agostinho da Silva), Mautner, aos 78 anos, acaba fazendo o manual de resistência civilizacional que nem Caetano nem Chico, ocupados na guerra de contrainformação e acuados pelo fascismo das redes sociais, conseguirão fazer neste momento. De beleza aguda e urgência filosófica, é o disco mais importante desta safra da MPB.
A segunda canção, Ouro e Prata na Mão, tem a marcação do maracatu Pavão Mysteriozo e a solenidade da Procissão de Gil (assim como Segredo, a quarta canção, embutida em maracatu de baque virado, prima-irmã de Maracatu Atômico). A terceira canção, Oy Vey, é desabafo de monge: por que tanta desumanidade ao invés de piedade? Mesmo um homem de Deus não pode deixar de se indignar com o que acontece em seu país. Mas à indignação sucede a amorosidade. “A beleza de tudo é sempre uma surpresa”. Oy Vey conecta-se à última canção das 12 do disco, Yeshua Ben Joseph, um gospel estufado de sincretismo e milenarismo que traz os princípios fundamentais do mautnerismo: o alistamento na escola do perdão, a misericórdia, a piedade, a luta sem tréguas pelo humanismo.
Os violões são lindos. A voz de Ana Lomelino é um anteparo para os lamentos judaicos da voz de Mautner. Os meninos da Banda Tono, de Bem Gil, estão em estado de graça, e ajudam também nos coros e nos solos. De marchinhas carnavalescas a marchas militares, a música de Jorge Mautner presta-se a que “brotem os amores de todos os tipos, de todas as cores”, único segredo para derrotar os medos.
Decididamente, não há disco mais bonito que o do menestrel prototropicalista nesta temporada
A primeira canção é como um ofertório familiar, crepuscular, de um homem que já inventaria o seu legado (que nada tem de físico, só de afetividades): a filha Amora, a neta Júlia, o candomblé, a fé, o equilíbrio da ioga, o zen, a pacificação pelo reggae, o ritmo, o destemor. O nome da música, Ruth Rainha Cigana, é uma reverência à historiadora Ruth Mendes, que foi companheira de Jorge Mautner.
Com Não Há Abismo em Que O Brasil Caiba (título extraído de uma frase do filósofo português Agostinho da Silva), Mautner, aos 78 anos, acaba fazendo o manual de resistência civilizacional que nem Caetano nem Chico, ocupados na guerra de contrainformação e acuados pelo fascismo das redes sociais, conseguirão fazer neste momento. De beleza aguda e urgência filosófica, é o disco mais importante desta safra da MPB.
A segunda canção, Ouro e Prata na Mão, tem a marcação do maracatu Pavão Mysteriozo e a solenidade da Procissão de Gil (assim como Segredo, a quarta canção, embutida em maracatu de baque virado, prima-irmã de Maracatu Atômico). A terceira canção, Oy Vey, é desabafo de monge: por que tanta desumanidade ao invés de piedade? Mesmo um homem de Deus não pode deixar de se indignar com o que acontece em seu país. Mas à indignação sucede a amorosidade. “A beleza de tudo é sempre uma surpresa”. Oy Vey conecta-se à última canção das 12 do disco, Yeshua Ben Joseph, um gospel estufado de sincretismo e milenarismo que traz os princípios fundamentais do mautnerismo: o alistamento na escola do perdão, a misericórdia, a piedade, a luta sem tréguas pelo humanismo.
Os violões são lindos. A voz de Ana Lomelino é um anteparo para os lamentos judaicos da voz de Mautner. Os meninos da Banda Tono, de Bem Gil, estão em estado de graça, e ajudam também nos coros e nos solos. De marchinhas carnavalescas a marchas militares, a música de Jorge Mautner presta-se a que “brotem os amores de todos os tipos, de todas as cores”, único segredo para derrotar os medos.